COVID-19 e Necrochorume

Foto: Fernando Marrom/ATP.

Existem diversos impactos ambientais que a urbanização gera no solo, um deles são os cemitérios, que podem gerar grandes problemas quando sua localização e manejo são inadequados. A decomposição dos corpos depende das características físicas do solo onde o cemitério está implantado, podendo contaminar os solos e mananciais existentes por microrganismos, que se proliferam no processo de decomposição. Quando há um aumento do volume das chuvas, o processo de transporte do necrochorume é acelerado, ocasionando maior contaminação.

Essa contaminação pode atingir os lençóis freáticos através desse necrochorume, líquido liberado pelos cadáveres em putrefação, que consiste numa solução aquosa rica em sais minerais e substâncias orgânicas desagradáveis, viscosa e de cheiro forte. Cada corpo decomposto libera até 40 litros de chorume. Desta forma, um determinado local recebendo esta quantidade de líquido infiltrado no solo e sem nenhuma medida mitigadora ou de prevenção desta contaminação, com certeza terá sérios problemas.

Muitos dos cemitérios urbanos se tornaram áreas contaminadas, por essa poluição ambiental no solo e nos aquíferos subterrâneos da região, em virtude da toxicidade do necrochorume e dos microrganismos patogênicos presentes nele. Alterações em um ambiente natural são muito importantes e devem ser acompanhadas de perto pelos órgãos ambientais, pois podem tornar o solo ou o aquífero inutilizável. A água subterrânea é a mais afetada pela contaminação por vírus e bactérias. Nascentes naturais conectadas ao aquífero contaminado podem transmitir doenças de veiculação hídrica como tétano, gangrena gasosa, toxi-infecção alimentar, tuberculose, febre tifoide, febre paratifoide, vírus da hepatite A, dentre outras.

O novo coronavírus, que causa a COVID-19, nos fez enfrentar uma pandemia mundial. O vírus necessita de um hospedeiro, ficando incubado por até duas semanas no organismo humano e permanecendo no cadáver por dias de forma ativa, o que repercute em potencial transmissão aos familiares e principalmente aos profissionais de saúde e agentes dos serviços funerários. Hoje, o Brasil já perdeu mais de 450 mil pessoas (24/05/2021) e estamos perdendo quase 2000 pessoas por dia, principalmente pela falta de vacinação.

Não se tem certeza de quanto tempo o coronavírus permanece no cadáver após ser sepultado. Entendendo que os compostos orgânicos liberados no processo de decomposição dos cadáveres são degradáveis e causam um aumento da atividade de microrganismos no solo sob a área de sepultamentos, nota-se nesse processo agravamento do processo de contaminação e proliferação do vírus no ambiente das necrópoles.

Dessa forma, o alerta torna-se mais importante, pois o corpo humano ao entrar em decomposição passa a servir como um fértil ecossistema para outros seres. Entre eles, bactérias, artrópodes, destruidores de matéria orgânica em geral, microrganismos patogênicos entre outros, e esses seres podem ser um risco ao meio ambiente e à saúde pública.

Portanto, é indispensável levantar novas questões quanto ao gerenciamento dos ambientes mórbidos, principalmente nesse momento em que o mundo vivencia um dos maiores problemas de saúde da história. A crise ocasionada pelo novo coronavírus traz à tona a necessidade de discutir e refletir sobre as questões socioambientais que envolvem a relação entre o espaço ocupado pelos cemitérios e o sepultamento de cadáveres frente às pandemias.


BIBLIOGRAFIA

Revista Especialize On-line IPOG - Goiânia - Edição nº 10 Vol. 01/ 2015 dezembro/2015.

NASCIMENTO, Francisleile Lima; SENHORAS, Elói Martins; FALCÃO, Márcia Teixeira. Necrópoles e os impactos ambientais: cemitério público municipal, Boa Vista-RR. Revista Baru-Revista Brasileira de Assuntos Regionais e Urbanos, v. 4, n. 2, p. 236-256, 2019.

Autoria: Azarias, V.; Pusceddu, L.(2021) Covid-19 e Necrochorume.

Créditos detalhados

Autores:

Victoria Azarias

Supervisão:

Luca Hermes Pusceddu - lhp@ib.usp.br